sábado, 27 de agosto de 2011

Ah que saudade moleca, que saudade sapeca ( para Cris)


Que saudade da moleca
da menina sapeca
brinca de xixi na cerca
brinca de ouvir saci deliciando a cerveja
brinca de ser as mil e uma noites e dias que somos

Ah que saudade da moleca
da menina sapeca
brinca de gravar as meninices no gravador sonhador
brinca à noite na escolinha sem professor
brinca de ser as mil e uma noites e dias que somos

Mas que saudade danada da moleca
da menina mais que sapeca
brinca de morder bumbum num trenzinho de dentes
brinca de dormir sobre o sol quente
brinca de ser as mil e uma noites e dias que somos

Ah, saudade dessa moleca
dessa sapeca,
da risada que desperta as borboletas dos meus sonhos
das flores (crisântemo e lírio), e até dos momentos tristonhos
de ser as mil e uma noites e dias que somos

Ah que saudade moleca, que saudade sapeca!










domingo, 13 de fevereiro de 2011

Ítaca - Belíssimo!

Ítaca 

Se partires um dia rumo a Ítaca
Faz votos de que o caminho seja longo
repleto de aventuras, repleto de saber.

Nem lestrigões, nem cíclopes,
nem o colérico Posidon te intimidem!
Eles no teu caminho jamais encontrarás
Se altivo for teu pensamento
Se sutil emoção o teu corpo e o teu espírito. tocar
Nem lestrigões, nem cíclopes
Nem o bravio Posidon hás de ver
Se tu mesmo não os levares dentro da alma
Se tua alma não os puser dentro de ti.

Faz votos de que o caminho seja longo.
Numerosas serão as manhãs de verão
Nas quais com que prazer, com que alegria
Tu hás de entrar pela primeira vez num porto
Para correr as lojas dos fenícios
e belas mercancias adquirir.
Madrepérolas, corais, âmbares, ébanos
E perfumes sensuais de toda espécie
Quanto houver de aromas deleitosos.
A muitas cidades do Egito peregrinas
Para aprender, para aprender dos doutos.

Tem todo o tempo Ítaca na mente.
Estás predestinado a ali chegar.
Mas, não apresses a viagem nunca.
Melhor muitos anos levares de jornada
E fundeares na ilha velho enfim.

Rico de quanto ganhaste no caminho
Sem esperar riquezas que Ítaca te desse.
Uma bela viagem deu-te Ítaca.
Sem ela não te ponhas a caminho.
Mais do que isso não lhe cumpre dar-te.
Ítaca não te iludiu
Se a achas pobre.
Tu te tornaste sábio, um homem de experiência.
E, agora, sabes o que significam Ítacas.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Quando o amor vacila - Maria Bethania


Eu sei que atrás deste universo de aparências,
das diferenças todas,
a esperança é preservada.
Nas xícaras sujas de ontem
o café de cada manhã é servido.
Mas existe uma palavra que não suporto ouvir,
e dela não me conformo.
Eu acredito em tudo,
mas eu quero você agora.
Eu te amo pelas tuas faltas,
pelo teu corpo marcado,
pelas tuas cicatrizes,
pelas tuas loucuras todas, minha vida.
Eu amo as tuas mãos,
mesmo que por causa delas
eu não saiba o que fazer das minhas.
Amo teu jogo triste.
As tuas roupas sujas
é aqui em casa que eu lavo.
Eu amo a tua alegria.
Mesmo fora de si,
eu te amo pela tua essência.
Até pelo que você poderia ter sido,
se a maré das circunstâncias
não tivesse te banhado
nas águas do equívoco.
Eu te amo nas horas infernais
e na vida sem tempo, quando,
sozinha, bordo mais uma toalha
de fim de semana.
Eu te amo pelas crianças e futuras rugas.
Eu te amo pelas tuas ilusões perdidas
e pelos teus sonhos inúteis.
Amo teu sistema de vida e morte.
Eu te amo pelo que se repete
e que nunca é igual.
Eu te amo pelas tuas entradas,
saídas e bandeiras.
Eu te amo desde os teus pés
até o que te escapa.
Eu te amo de alma para alma.
E mais que as palavras,
ainda que seja através delas
que eu me defenda,
quando digo que te amo
mais que o silêncio dos momentos difíceis,
quando o próprio amor
vacila.

Sophia Breyner - Poema Azul

Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim.
A tua beleza aumenta quando estamos sós
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho.
Que momentos há em que eu suponho
Seres um milagre criado só para mim

quinta-feira, 10 de junho de 2010

OS POETAS (Sophia Mello Breyner)

Solitários
pilares dos céus pesados,
Poetas nus em sangue, ó destroçados
Anunciadores do mundo
Que a presença das coisas devastou.
Gesto de forma em forma vagabundo
Que nunca num destino se acalmou. 




POESIA ( Sophia Mello Breyner)

Se todo o ser ao vento abandonamos
E sem medo nem dó nos destruímos,
Se morremos em tudo o que sentimos
E podemos cantar, é porque estamos
Nus em sangue, embalando a própria dor
Em frente às madrugadas do amor.
Quando a manhã brilhar refloriremos
E a alma possuirá esse esplendor
Prometido nas formas que perdemos.

Aqui, deposta enfim a minha imagem,
Tudo o que é jogo e tudo o que é passagem.
No interior das coisas canto nua.

Aqui livre sou eu — eco da lua
E dos jardins, os gestos recebidos
E o tumulto dos gestos pressentidos
Aqui sou eu em tudo quanto amei.

Não pelo meu ser que só atravessei,
Não pelo meu rumor que só perdi,
Não pelos incertos atos que vivi,

Mas por tudo de quanto ressoei
E em cujo amor de amor me eternizei
.

MAR ( Sophia Mello Breyner)

Mar, metade da minha alma é feita de maresia
Pois é pela mesma inquietação e nostalgia,
Que há no vasto clamor da maré cheia,
Que nunca nenhum bem me satisfez.
E é porque as tuas ondas desfeitas pela areia
Mais fortes se levantam outra vez,
Que após cada queda caminho para a vida,
Por uma nova ilusão entontecida.

E se vou dizendo aos astros o meu mal
É porque também tu revoltado e teatral
Fazes soar a tua dor pelas alturas.
E se antes de tudo odeio e fujo
O que é impuro, profano e sujo,
É só porque as tuas ondas são puras.